I - Mãos atadas
O homem segurava um copo de uísque
Sem gelo e sem piedade.
Após um gole deixou a metade
Assim como o seu próprio enfoque.
Um zumbido permanente incomodava
O violeiro que sentado, uma explicação ouvia.
Com um desconforto ele permanecia
Enquanto na proposta ele pensava:
"Ouvi dizer que você é caboclo valente,
Que de visagens e feras medo não têm,
Então digo que teus serviços a mim convêm
Neste momento de causas latentes.
Não leve a mal as mãos amarradas,
Precisava trazê-lo a mim rapidamente,
Mesmo que de maneira inconveniente
Na forma de uma emboscada.
Vejo que leva consigo estes medalhões
Que muito me deixaram intrigado.
Então ouça o que direi, mas com cuidado
Não repetirei novamente estas informações!
Porém antes, se comigo concordar
Em manter o mínimo de inteligência,
Agirei também com coerência
E eu mesmo irei te soltar".
II - Pensamentos
O violeiro só pensava na viola
Que no momento não estava consigo
E na chance que havia surgido
De concluir a sina que o assola
"Sei no que está pensando agora,
Mas fique tranquilo, eu te digo:
Sua viola está segura comigo,
Após nossa conversa tu a leva embora."
Levantados à claridade do dia,
Os medalhões causaram reflexos
Criando desenhos complexos
Na mesa que na sala havia.
O violeiro então falou:
"O que é um fósforo em meio o inferno?
E para que esse demorar eterno
Vamos, diga o que farei, e logo eu vou!
Devolva a minha viola e os medalhões,
E me explique logo o que pretende,
Meu tempo é curto, sei que você entende,
Então chega desses seus sermões!"
"Ora, ora, alguém aqui está bravo!"
Respondeu o homem com uma risada,
Seguida de uma cara fechada
Enquanto acendia um cigarro.
III - A proposta
"Estávamos te observando
Enquanto você sozinho tagarelava
E da árvore a viola tirava.
Achamos isso bem estranho.
Aproveitando sua distração,
Meus capangas o cercaram,
A viola de ti tomaram
E a mim te trouxeram, então.
Sou um homem de muitas ambições,
Ambições deste e de outros mundos.
Sei que você tem interesse profundo
Em consertar certas questões...
Então te digo algumas informações:
Das bestas que tu procuras,
Tenho interesse em duas,
Te mostrarei delas as localizações.
Tu me trará aceso neste lampião
O fogo que delas surgir quando as matar,
Mas preste atenção, não deixe o fogo apagar
Senão todas suas tentativas terão sido em vão.
Deverá pegar o trem que sai às onze
E desembarcar na cidade da louça.
Vá até o cemitério, feche os olhos e ouça
O farfalhar de asas na cruz grande."
IV - Justa
"Aceita esta proposta?
Estamos assim pois não houve outro jeito
Quero que saiamos satisfeitos,
Acredito que é uma oferta justa"
"Justa é uma palavra forte
Para um homem que está amarrado.
Vamos, me solte rápido,
Aceito a proposta, não aceito a morte.
Caso eu não consiga trazer as chamas,
O que você fará então?"
O homem vira de costas e olha para o chão,
E em uma voz rouca exclama:
"A morte seria lucro para você,
Se não trouxer o que peço;
A pena que eu te ofereço
É algo pior do que o diabo pode oferecer...
Mas não se preocupe agora,
Eu saberei de tudo o que acontecerá!
Tenho olhos e ouvidos lá
Então não poderá fugir desta obra"
Após olhares trocados,
O homem solta o violeiro, que fraco se levanta
Entrega a viola e para a porta aponta
Lá fora está um dia ensolarado.
V - O Sol, a fome e o pão
Sentiu-se traído e com ódio reprimido.
Sentiu-se completamente sozinho,
Sentiu o sol no caminho
Sentiu-se até pelo diabo esquecido.
Chegou o final da tarde e o sol baixava.
A paisagem era bela, mas incerta
A estrada era longa, porém estreita.
Chegou a noite e a lua no céu se encaixava.
Eram nove horas,
A estação de trem estava perto,
Porém a fome causava aperto
Não comia havia eras.
Chegou na estação,
Mas a fome chegou primeiro.
Sentiu um bom cheiro,
Que vinha de um balcão.
Não tinha nenhum trocado
Para comprar uma refeição,
Quando estava desistindo, então,
Alguém apareceu ao seu lado,
E logo se retirou.
Deixou com o violeiro um pacote,
Com um pão, uma passagem e um bilhete:
"Pão que seu contratante amassou."
VI - Cruz grande e penas
Comeu o pão, engoliu incertezas,
E ouviu o trem chegando na estação.
Segurou a passagem com as mãos
E entregou no guichê sem delicadeza.
Estava sozinho no vagão,
Parecia uma longa viagem.
Era o único personagem
Daquela locomoção.
Onze e trinta quatro,
Onze e quarenta e sete.
A estação então aparece
E o trem diminui o passo.
Da estação do trem via-se
A cidade da louça que silenciosa dormia,
Mas o violeiro muito acordado e em agonia
Para a direção do cemitério voltava-se.
Adentrou o cemitério,
E andou até a cruz grande.
Encarou-a por um instante
E seus olhos fechou, sério.
Ouviu um farfalhar de penas
E abriu os olhos rapidamente;
Viu um anjo com asas resplandecentes,
Mas as asas eram pretas!
Fabiano Favretto
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