quinta-feira, 28 de novembro de 2019

Ao Miguel, meu afilhado

Bem vindo ao mundo!
Se depender de mim,
Te darei tudo!

Fabiano Favretto

Aparecerá

Não fumarei mais hoje,
Mas a nicotina brigará
Por eu manter o cigarro longe;
A abstinência aparecerá.

Fabiano Favretto

Vêm e vão

Pessoas vêm e vão,
Mas como saber se isso
Não vêm em vão?

Fabiano Favretto

Leigos

Todos sabem
Que os melhores Opalas
Tem 6 cilindros em linha.
Porém, os Mavericks
Não possuem dos leigos
O mesmo entendimento.

Fabiano Favretto

Manhattan

A apresentação da banda
Tem um saxofonista.
Esse pessoal acha que está onde?
Em Manhattan?

Fabiano Favretto

Isolação

Quanto mais gente
No mesmo lugar,
Mais tenho certeza:
Quero me isolar.

Fabiano Favretto

Blues

Hoje escrevo 
De azul,
Pois me sinto triste
Como o blues.

Fabiano Favretto

Tijolo

No buraco do tijolo
Uma teia de aranha.
Ocupada?
Talvez sim.
Desocupada?
Talvez sim.
Em todo caso,
A teia em meu peito
É resultado da desocupação:
Neste muro,
Nem tem mais coração.

Fabiano Favretto

Sobre o que dizem quando se está mal

"Mas você escreve poesia"
"Mas você tem um dom e tanto"
"Mas você é poeta"
"Mas você escreve bem"
"Mas você consegue se expressar"

Fabiano Favretto

Hemorragia

Escrevo agora de vermelho
Porque tenho no papel mais sangue
Do que poesia nas veias.
Essa corrente sanguínea
Diretamente ao papel
Obstina-me a ter
Uma enorme hemorragia.

Fabiano Favretto

Alento

Tenho pouco tempo.
Até agora não escrevi
Poesia ao meu alento.

Fabiano Favretto

Ir embora queira ficar

Tenho pouco mais
De uma hora.
Passa rápido demais
O tempo
Quando é preciso
Ir embora.

Fabiano Favretto

Fome

Fome de vida
Ou seria
Fome de ida?

Fabiano Favretto

Round #2

O perfume é de conhaque:
O sinto pela segunda vez.

Fabiano Favretto

Momento

Tenho menos de duas horas
Para escrever, beber e viver.
Me sinto como as velhas senhoras
Esperando o momento de morrer.

Fabiano Favretto

Meu texto

O conhaque é meu texto.
Não preciso de nada
Ou de qualquer pretexto.

Fabiano Favretto

Chateia

Folha em branco:
No desespero
Me vem o pranto.

Folha um pouco escrita.
Reconsidero:
Isso me excita.

Folha meio escrita:
Faltou espaço,
Faltará tinta.

Folha quase cheia:
Me faltam versos,
O que me chateia.

Fabiano Favretto

Prático

Espero
E desespero.
Canso rápido
E descanso prático.

Fabiano Favretto

Pré-texto

O conhaque é pré-texto:
Não preciso de água
Para escrever meus textos.

Fabiano Favretto

Haikai #9

Noite vazia.
No caderno
O coração se alivia.

Fabiano Favretto

Haikai #8

Garrafas vazias na prateleira.
Nunca mais quem tomou
Sentiu sede.
Fabiano Favretto

Haikai #7

Velha máquina registradora.
Ouço sua campainha
Mesmo não funcionando.

Fabiano Favretto

Haikai #6

Mosquitos no fliperama.
Space Invaders
Na vida real

Fabiano Favretto

A necessidade

A necessidade
É algo que vem
Quando você
Não precisa de nada.

Fabiano Favretto

Pretexto

O conhaque é pretexto:
Não preciso de nada
Para escrever meus textos.

Fabiano Favretto

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

Antígeno anticorpo

Sou anticorpo
E você é meu antígeno.
Como chave-fechadura,
Fazemos um sistema-complemento,
Para podermos inflamar tudo ao redor.
Em uma cascata,
Desencadeamos ataques aos patógenos
Que nos fazem tanto mal.
Temos assim uma lise osmótica!
Seguimos pela via das lectinas,
Pela via clássica, alternativa
Pela extensa corrente sanguínea!

Fabiano Favretto

Piada inflamada

Porque o linfócito entrou na banda?
Para tocar fagócito!

Fabiano Favretto

Memória imunológica

Meu coração
Não tem memória imunológica,
É tão inespecífico
Que qualquer amor
Que o invade,
O domina.


Fabiano Favretto

Fagocitados

Ó célula apresentadora de antígenos,
Porque és capaz de expor fragmentos
Destes antígenos já fagocitados
Em sua superfície junto ao líquido sanguíneo?

Linfócitos reconhecedores de antígenos,
Sois controladores da resposta imune.
Por que então são enganados de forma impune
Por essas células mentirosas sem raciocínio?

Fabiano Favretto

Complexo de MHC

Histocompatibilizamos nossas membranas,
Mas disso não sofremos complexos,
Pois muito sei que juntos combinamos
E poderemos juntos fazer descendentes bacanas.

Fabiano Favretto

Apontamentos

Às 06:00 da manhã meu coração acorda;
Às 06:01 da manhã meu coração lembra-se de ti;
Às 06:02 da manhã meu coração entristece;
Às 06:03 da manhã meu coração chora;
Às 06:04 da manhã meu coração enxuga as lágrimas.
Às 06:05 da manhã meu coração já sofreu pelo dia todo.
Às 12:00 meu coração almoça;
Às 12:01 meu coração lembra-se de ti;
Às 12:02 meu coração entristece;
Às 12:03 meu coração chora;
Às 12:04 meu coração enxuga as lágrimas;
Às 12:05 meu coração já sofreu pela semana inteira.
Às 06:00 da tarde meu coração sai do trabalho;
Às 06:01 da tarde meu coração lembra-se de ti;
Às 06:02 da tarde meu coração entristece;
Às 06:03 da tarde meu coração chora;
Às 06:04 da tarde meu coração enxuga as lágrimas;
Às 06:05 da tarde meu coração já sofreu pelo mês de novembro.
Às 08:00 da noite meu coração toma conhaque;
Às 08:01 da noite meu coração lembra-se de ti;
Às 08:02 da noite meu coração entristece;
Às 08:03 da noite meu coração chora;
Às 08:04 da noite meu coração enxuga as lágrimas;
Às 08:05 da noite meu coração já sofreu pelo ano que acaba.
Às 00:00 meu coração deita na cama;
Às 00:01 meu coração lembra-se de ti;
Às 00:02 meu coração entristece;
Às 00:03 meu coração chora;
Às 00:04 meu coração enxuga as lágrimas;
Às 00:05 meu coração sonha em nunca mais acordar.
Às 06:00 da manhã meu coração acorda...

Fabiano Favretto

Quarta-feira

Você sabe o quanto queria
Estar junto de ti, isso é certo,
Mas o que fazer, se estar perto
É algo que me machucaria?

Nem todos os drinks e bebidas,
Nem todo álcool do mundo,
São capazes de te arrancar do fundo
De mim - não gosto de partidas.

Toca agora uma canção na vitrola,
Que me marca tristemente.
Não existe música que consola:

Me sinto cada vez mais deprimente.
E essa tristeza é que me isola
Da vontade de viver plenamente.

Fabiano Favretto

Motor

O coração é um motor
Que funciona eternamente
Sem se preocupar
Se a estrutura que o comporta
Tem freio, segurança ou direção.

Outro dia mesmo
Ele recebeu um amor
Como combustível
E acelerou demais.
Buum! 
Acidentes acontecem:
Quebrou minha cara
E a minha felicidade.

A moça passa bem.

Eu arquei com o preço:
Sem seguro
E sem recursos
Para conserto,
Estou guinchando
Esta estrutura
Até onde posso.

O valor do guincho
Me apavora,
E retificar esse motor
Vai me requerer
Muita cautela e paciência.
Espero que dê conserto.


Fabiano Favretto

Menos

Me sinto tão menos,
Me sinto tão louco.
Com tantos pormenos
Me sinto até pouco.

Me sinto nulo,
Me sinto nada.
E lá no fundo
É tudo charada.

Vida que me mata,
Morte que me ajuda,
Dor que aparata.

Sangue, corda,
Dúvida que desperta
E estou na borda.

Fabiano Favretto

Não há cura

Bombas de milhares de megatons
Caíram hoje sobre minha cabeça
Para que eu me abale e não esqueça
Que a realidade não tem propósitos bons.

Tristeza, revolta e ódio eclodiram
Em meu peito novamente despreparado.
Angústia, pensamentos - maldito fado!
As expectativas me consumiram.

Acabou-se a luz, e a última vela apagou.
No escuro por tato venho buscando
Encontrar um lampejo do que de mim restou.

Sou cacos, vidro e Éter, matéria escura;
Um buraco negro agora absorve o meu interior.
Não mais há conformação, lucidez e cura.

Fabiano Favretto

Desçamos a colina

Desçamos a colina e nos perpetuemos
Nas estagnarias fontes de ausência,
De modo que propositalmente, em instância,
Ao som da marcha lúgubre dancemos.

Avancemos entre trincheiras e escombros,
Nos lotes perenes de falsas misericórdias,
Escalando tetos, aves, medos e ledas glórias
Para carregarmos o nosso mundo nos ombros.

Corramos como lebres assustadas à noite,
Agitados como o trigo em tarde tempestuosa.
Voemos como um filhote à própria sorte,

Esperando que as presas da morte perigosa
Errem o caminho da fonte, amor forte
E mate o que realmente seja dor dolorosa.
Fabiano Favretto

terça-feira, 5 de novembro de 2019

Viés

Caminho agora sozinho e preciso,
Em faixas de pedestres já gastas. 
Me aparecem memórias inexatas
De algo bom que houve comigo.

É dia e o céu está tão baixo e escuro.
As nuvens trouxeram a chuva necessária
Para levar essa minha dúvida ordinária:
Saber que não se está em cima do muro.

O céu tem a mesma cor do asfalto,
No entanto, não posso tocá-lo com os pés.
A rua nunca acaba de sobressalto

Nem o sentimento desse meu revés.
Nada é capaz de levar-me ao alto,
Ou de mudar esse meu trágico viés.

Fabiano Favretto

segunda-feira, 4 de novembro de 2019

Roubou

Você roubou minha voz e minha paz,
Tudo o que eu tinha de mais meu.
E me entreguei e você não compreendeu
Que isso não tem volta jamais.

Você me matou, e até que estou relevando,
Por não levar em conta o que sinto.
Se eu disser que estou bem, eu minto,
Não me preocupo com a dor aumentando.

Vou andar por aí em qualquer canto,
Eu não sei um caminho certo a seguir.
Apenas eu irei andando, por enquanto,

Até meu coração poder suprimir
Esse amor que me arde tanto
Para que eu possa talvez sorrir.

Fabiano Favretto