quinta-feira, 29 de junho de 2023

Catarata

Operei a catarata:

Não vi mais

Nenhuma outra

Queda d'água.


Fabiano Favretto

Contém ironia:

O ferro não vai mais.


Fabiano Favretto

Caicai

Pobre 

Coitado:

Pobre,

Cai todo.


Fabiano Favretto

Telhado de vidro

Mira,

Mas me erra.

Me abaixo:

Dessa vez

Era pedra.


Fabiano Favretto

Rigor Mortis IV

I - Mãos atadas


O homem segurava um copo de uísque

Sem gelo e sem piedade.

Após um gole deixou a metade

Assim como o seu próprio enfoque.


Um zumbido permanente incomodava

O violeiro que sentado, uma explicação ouvia.

Com um desconforto ele permanecia

Enquanto na proposta ele pensava:


"Ouvi dizer que você é caboclo valente,

Que de visagens e feras medo não têm,

Então digo que teus serviços a mim convêm

Neste momento de causas latentes.


Não leve a mal as mãos amarradas,

Precisava trazê-lo a mim rapidamente,

Mesmo que de maneira inconveniente

Na forma de uma emboscada.


Vejo que leva consigo estes medalhões

Que muito me deixaram intrigado.

Então ouça o que direi, mas com cuidado

Não repetirei novamente estas informações!


Porém antes, se comigo concordar 

Em manter o mínimo de inteligência,

Agirei também com coerência

E eu mesmo irei te soltar".


II - Pensamentos


O violeiro só pensava na viola

Que no momento não estava consigo

E na chance que havia surgido

De concluir a sina que o assola


"Sei no que está pensando agora,

Mas fique tranquilo, eu te digo:

Sua viola está segura comigo,

Após nossa conversa tu a leva embora."


Levantados à claridade do dia,

Os medalhões causaram reflexos

Criando desenhos complexos

Na mesa que na sala havia.


O violeiro então falou:

"O que é um fósforo em meio o inferno?

E para que esse demorar eterno

Vamos, diga o que farei, e logo eu vou!


Devolva a minha viola e os medalhões,

E me explique logo o que pretende,

Meu tempo é curto, sei que você entende,

Então chega desses seus sermões!"


"Ora, ora, alguém aqui está bravo!"

Respondeu o homem com uma risada,

Seguida de uma cara fechada

Enquanto acendia um cigarro.


III - A proposta


"Estávamos te observando

Enquanto você sozinho tagarelava

E da árvore a viola tirava.

Achamos isso bem estranho.


Aproveitando sua distração,

Meus capangas o cercaram,

A viola de ti tomaram

E a mim te trouxeram, então.


Sou um homem de muitas ambições,

Ambições deste e de outros mundos.

Sei que você tem interesse profundo

Em consertar certas questões...


Então te digo algumas informações:

Das bestas que tu procuras,

Tenho interesse em duas,

Te mostrarei delas as localizações.


Tu me trará aceso neste lampião

O fogo que delas surgir quando as matar,

Mas preste atenção, não deixe o fogo apagar

Senão todas suas tentativas terão sido em vão.


Deverá pegar o trem que sai às onze

E desembarcar na cidade da louça.

Vá até o cemitério, feche os olhos e ouça

O farfalhar de asas na cruz grande."


IV -  Justa


"Aceita esta proposta?

Estamos assim pois não houve outro jeito

Quero que saiamos satisfeitos,

Acredito que é uma oferta justa"


"Justa é uma palavra forte

Para um homem que está amarrado.

Vamos, me solte rápido,

Aceito a proposta, não aceito a morte.


Caso eu não consiga trazer as chamas,

O que você fará então?"

O homem vira de costas e olha para o chão,

E em uma voz rouca exclama:


"A morte seria lucro para você,

Se não trouxer o que peço;

A pena que eu te ofereço

É algo pior do que o diabo pode oferecer...


Mas não se preocupe agora,

Eu saberei de tudo o que acontecerá!

Tenho olhos e ouvidos lá

Então não poderá fugir desta obra"


Após olhares trocados,

O homem solta o violeiro, que fraco se levanta

Entrega a viola e para a porta aponta

Lá fora está um dia ensolarado.


V - O Sol, a fome e o pão


Sentiu-se traído e com ódio reprimido.

Sentiu-se completamente sozinho,

Sentiu o sol no caminho

Sentiu-se até pelo diabo esquecido.


Chegou o final da tarde e o sol baixava.

A paisagem era bela, mas incerta

A estrada era longa, porém estreita.

Chegou a noite e a lua no céu se encaixava.


Eram nove horas,

A estação de trem estava perto,

Porém a fome causava aperto

Não comia havia eras.


Chegou na estação,

Mas a fome chegou primeiro.

Sentiu um bom cheiro,

Que vinha de um balcão.


Não tinha nenhum trocado

Para comprar uma refeição,

Quando estava desistindo, então,

Alguém apareceu ao seu lado,


E logo se retirou.

Deixou com o violeiro um pacote,

Com um pão, uma passagem e um bilhete:

"Pão que seu contratante amassou."


VI - Cruz grande e penas


Comeu o pão, engoliu incertezas,

E ouviu o trem chegando na estação.

Segurou a passagem com as mãos

E entregou no guichê sem delicadeza.


Estava sozinho no vagão,

Parecia uma longa viagem.

Era o único personagem

Daquela locomoção.


Onze e trinta quatro,

Onze e quarenta e sete.

A estação então aparece

E o trem diminui o passo.


Da estação do trem via-se

A cidade da louça que silenciosa dormia,

Mas o violeiro muito acordado e em agonia

Para a direção do cemitério voltava-se.


Adentrou o cemitério,

E andou até a cruz grande.

Encarou-a por um instante

E seus olhos fechou, sério.


Ouviu um farfalhar de penas

E abriu os olhos rapidamente;

Viu um anjo com asas resplandecentes,

Mas as asas eram pretas!


Fabiano Favretto



Xarope

Dor de amor

É escarro:

Do meu peito

Só sai

Catarro.


Fabiano Favretto

Ema toma

Tatuada na pele

Uma grande ave:

Ema toma

Banho de tinta

Roxa.


Fabiano Favretto

Adição

- Some logo daqui!
- Até quanto?

Fabiano Favretto

Socorro

É-se, 

Ou esse?


Fabiano Favretto